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Travestis sofrem com exclusão diariamente

Travestis sofrem com exclusão diariamente (Foto: Wagner Almeida)
Ela nasceu como ele, mas, desde criança, se sentia como ela. Não via dentro de si o mesmo menino que enxergava no espelho. E, com o tempo, foi percebendo que a forma como se comportava incomodava às pessoas. “Desde criança eu ouço as pessoas cochichando se eu era ou não veado”, recordou G, adolescente de 17 anos, que desde os 15 abandonou o nome de batismo com o qual não se identificava e foi enfrentar a dura realidade de assumir publicamente a orientação sexual de travesti.
O DIÁRIO conversou com G. na madrugada da última quarta (04/07), enquanto ela fazia programa em uma rodovia de Belém, ao lado de outras travestis adolescentes. Em comum, mais do que saltos altos, roupas curtas e partes íntimas à mostra. Naquele mesmo ponto, biografias de pessoas marginalizadas, que resolveram enfrentar o que for para serem o que querem ser, eram compartilhadas. Com 15 anos, G. começou a usar prótese no corpo e assumir publicamente que era travesti. “Minha mãe foi ‘o doce’ pra aceitar. Tive muita dificuldade com ela. Já com meu pai, não”.
“Tu te decide o que quer ser. Ou vai ser uma bicha ou uma trava”, intimou a amiga de G, Daniele Barcelar, 23 anos. Com 17 anos, ela vivia com essa dúvida na cabeça, quando foi interpelada durante uma viagem ao município de Soure, no arquipélago do Marajó. No mesmo dia, segundo ela, ficou resolvido em seu íntimo que queria mudar de corpo. O “rito de passagem” desse processo foi quando ela recebeu a primeira dose injetável de um hormônio utilizado por pessoas do sexo masculino que buscam ter formas de mulher.
“No início eu resisti, porque minha mãe não sabia. Mas aí a ‘bicha’ me levou até uma farmácia e me convenceu a comprar o hormônio. E o resultado é imediato. A primeira coisa que sentimos é muita fome. Logo depois, aparece um carocinho no nosso peito, que é muito gratificante. Algumas se viciam, até”, explicou.
RUAS

Para Symmy Larrat, do Grupo de Resistência de Travestis e Transexuais do Pará (Gretta), o fato de as travestis e transexuais se assumirem cada vez mais cedo, ainda na adolescência, e entrarem para o mundo da prostituição está ligado diretamente à fama do “dinheiro fácil”, que existe na profissão.
“Aqui no Pará sempre encontramos uma trava ou uma trans que se deram bem lá fora. Por isso, cada dia mais cedo as bichas acabam criando coragem de se assumir mais cedo, porque existe uma rota consolidada de prostituição Pará/São Paulo. E elas sabem que se não for na rua, dificilmente elas vão conseguir grana em outro lugar, porque ninguém quer contratar travesti e transexual”, analisa Larrat.
Assim que chegou à Belém, vinda de Soure, Daniele resolveu contar para a família que resolvera assumir a orientação sexual de travesti. A reação da família foi instantânea. E, logo após a declaração, ela foi expulsa de casa. Como já tinha o contato de uma cafetina em São Paulo, resolveu ligar, e, no dia seguinte já estava viajado para um dos estados brasileiros que mais recebe jovens travestis.
PROGRAMA

Segundo as travestis que fazem programa nos pontos da BR-316, em média, o preço cobrado em São Paulo por um programa não é muito maior do que em Belém, ou seja, de R$ 50 a R$ 80 o programa completo.
“Muita bicha se vicia para poder aguentar tranco da noite. Não é fácil ter que sair com qualquer um que aparece. Mas, se quisermos ter o corpo que sonhamos, não podemos recusar”, confirmou L, 21 anos. Ela, que se declarou viciada em cocaína, revelou ainda que muitos clientes só saem com travas que cheiram pó.
L. explicou ainda que muitas começam a roubar porque não suportam mais fazer programa; outras porque precisam sustentar o vício. “Somos gente como todo mundo. Se você apanha a vida toda, na hora que tem oportunidade de bater você vai bater com toda força que tem. Eu dificilmente faço isso (roubar), mas tem dia que é o Ó ”, revelou.
Mesmo com todo esforço, grande parte delas mal consegue dinheiro para fazer implante com silicone industrial. “A gente compra gel lubrificante de pneu de carro. Em mim foi a minha cafetina mesma quem aplicou. É uma seringa enorme, com uma agulha grossa o suficiente pra passar o gel. A gente só recebe uma anestesia pra não sentir a agulhada. Mas a dor de sentir o silicone, se alojando entre a nossa pele e a nossa carne é inevitável”, recordou, com uma leve expressão de careta. O local onde é aplicado esse tipo de prótese sempre fica dolorido, partilhou Daniele.
(Diário do Pará)

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